Juiz diz que responsabilidade pelo caos no sistema carcerário é também da magistratura

O juiz Márcio Keppler, do TJ do Rio Grande do Sul (TJRS), avalia que a magistratura brasileira também é responsável pelas condições deploráveis do sistema carcerário quanto o poder Executivo. Keppler fez palestra na tarde desta segunda-feira (13/5) aos 120 juízes que participam do IV Curso de Iniciação Funcional para Magistrados da Escola Nacional de […]

O juiz Márcio Keppler, do TJ do Rio Grande do Sul (TJRS), avalia que a magistratura brasileira também é responsável pelas condições deploráveis do sistema carcerário quanto o poder Executivo. Keppler fez palestra na tarde desta segunda-feira (13/5) aos 120 juízes que participam do IV Curso de Iniciação Funcional para Magistrados da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados Ministro Sálvio de Figueiredo (Enfam).

O magistrado gaúcho, que é ex-juiz auxiliar do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – onde trabalhou no Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e Medidas Socioeducativas -, lembrou que cerca de 44% da população carcerária do Brasil, que hoje supera os 580 mil detentos, é composta de presos provisórios. “Isso é responsabilidade direta dos juízes, porque ou deixaram de julgar o provisório ou não determinaram que ele saísse de lá. Nós estamos banalizando a prisão provisória. Então a superlotação do sistema não é culpa só do Executivo”, afirmou.

Keppler disse que o déficit de vagas no sistema carcerário chega a 188 mil unidades. Com longa experiência de inspeções em presídios pelo CNJ, o magistrado apresentou algumas fotografias da realidade do sistema: imagens de superlotação e condições sanitárias lastimáveis. “É uma pena que fotografia não tenha cheiro nem sensação térmica”, afirmou. Algumas imagens positivas, representando projetos de ressocialização, foram também apresentadas.

Conhecer a realidade

O juiz exortou seus pares a conhecerem de perto a realidade dos presídios. “Vocês precisam ir num presídio. Imaginar o que é viver uma semana, um mês naquelas condições. Devem se perguntar se o preso pode se recuperar numa situação daquelas. É preciso essa noção da realidade até para avaliar a efetividade das medidas que os senhores irão aplicar”, disse.

Além de conhecer os presídios, Keppler defende que o juiz de execuções deve ser “mais gente e mais que mero julgador”. “É preciso desmistificar os discursos do preso ‘facínora perigoso’ e o do preso ‘coitadinho’. As situações são as mais diversas”, apontou.  

Por outro lado, o magistrado gaúcho destacou que existem também boas iniciativas no sistema, como nos casos do Espírito Santo e do interior de São Paulo, que criaram muitas instituições modelo. “Notamos que a ação do magistrado na comarca, em especial os juízes de primeira instância, faz uma grande diferença na qualidade da política carcerária”, observou. O juiz Keppler opinou que, para “arrumar a casa” do sistema carcerário, seria necessário, com otimismo, pelo menos 10 anos. “Mas a solução não é só construir mais presídios, mas mudar a mentalidade de juízes e sociedade, criar estruturas que permitam a aplicação de penas alternativas e outras providências”, ponderou.

Depen

O diretor do Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça (DEPEN/MJ), Eduardo Sousa Rossini, que também proferiu palestra no Curso de Iniciação, concordou com Keppler e destacou que “o executivo não é um guardador de gente”. Para ele, “no Brasil se encarcera muito e mal”. Defendeu que a prisão deva ser usada de uma forma mais adequada e proporcional ao delito. “Há um olhar equivocado da sociedade e da mídia sobre a questão. Maltratar o preso é burrice, pois hoje ele está contido, mas amanhã ele está contigo”, observou.

Rossini também disse que para uma reintegração dos presidiários é vital implementar três eixos de ação: Apoio à saúde, ao trabalho e ao ensino. “A prisão deve excluir gente perigosa e não ser usada indiscriminadamente, como já ocorreu em algumas comarcas”, concluiu.

(FAC/CHA)