Juristas brasileiros e alemães discutem direitos reais e imobiliários

Seminário reuniu especialistas em Brasília e terá continuidade em Florianópolis, na próxima segunda-feira

A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) realizou nesta sexta-feira, 8 de março, a quinta edição do seminário Brasil Alemanha, sobre Direitos Reais e Imobiliários. Na parte da manhã foram apresentados dois painéis, com a participação de juristas brasileiros e alemães. O evento é promovido em parceria com o Tribunal Regional Federal da 4ª Região – Seção Judiciária de Santa Catarina, com o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, com o Instituto de Direito Processual Civil Alemão e Comparado da Faculdade de Direito da Universidade Albert-Ludwigs de Friburgo, com a Escola Nacional dos Notários e Registradores (ENNOR), com a Associação dos Juízes Federais (Ajufe) e com a Associação dos Juízes Federais de São Paulo e do Mato Grosso do Sul.

A primeira mesa abordou a transmissão de bens imóveis e o futuro do registro imobiliário, com apresentação de Rolf Stürner. A mesa foi presidida pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça João Otávio de Noronha e pelo presidente da Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg-BR), Rogério Bacellar. Participaram como debatedores os especialistas Jens Bormann e Gustavo Tepedino.

Responsável pela abertura, o ministro Noronha deu boas-vindas aos participantes e aos palestrantes alemães. Ele destacou que eventos como este fortalecem laços com juristas alemães. “Hoje renovamos novas perspectivas de intercâmbio entre o Brasil e a Alemanha, que oxalá permaneça no calendário dos dois países”, disse.

O magistrado afirmou que nada pode ter beneficiado mais os negócios jurídicos no Brasil do que o aperfeiçoamento do sistema cartorário. “Em tempos passados, os titulares eram nomeados não pela capacidade e talento, mas pelo prestígio e apadrinhamento político. Um dos avanços da Constituição de 88 foi modernizar o recrutamento de profissionais para trabalharem nessa área sensível e tão importante para o país. O Brasil hoje tem profissionais que ocupam esses cargos por meio de seleção, de concurso público, e o que mais me agrada é o elevado nível de profissionalismo. Grande parte tem mestrado e doutorado, e senso de responsabilidade ímpar”, destacou.

Rolf Stürner ressaltou a importância da propriedade imobiliária mesmo em tempo de digitalização e virtualização. “A segurança de investimento em terra é a base do desenvolvimento humano. Para o ser humano, a terra é a base para sua atuação assim como o ar para respirar, e com a virtualização isso não mudou. A virtualização só tem sentido se contribui para as pessoas que vivem no mundo real”, falou.

Stürner apresentou o modelo alemão de segurança jurídica na aquisição de imóvel, fez uma comparação, abordando traços convergentes e divergentes, com o Direito Imobiliário dos Estados Unidos, explicou sobre o direito inglês moderno e também destacou a problemática de formulários eletrônicos, em que a assessoria humana é substituída por formulários padronizados em casos simples e similares para processamento acelerado. “A tese do homem moderno que não necessita mais do contato inter-humano poderia ser errada. Com a pandemia de Covid tivemos uma prova dura disso; entendeu-se que na falta de contato humano direto, o ser humano não se desenvolve bem. Na natureza ele precisa de retorno ao estabelecer um contato pessoal, e isso também vale para a vida comercial, para o Direito, para professores, alunos e juízes”, observou.

Em seguida, o presidente da Anoreg-BR falou sobre a importância do intercâmbio com juristas alemães, que incentivaram a criação de novo sistema de matrícula. “Estamos sempre de portas abertas para todo tipo de evento que possa melhorar a atuação notarial e registral brasileira”, disse.

Para finalizar o painel, o público contou com as observações de Jens Bormann, Gustavo Tepedino e Leonardo Brandelli. “A apresentação do professor Stürner marcou pela beleza inspiradora da associação da propriedade às necessidades vitais, inclusão social e liberdade. O Brasil precisa ouvir essa lição”, opinou Tepedino. Por fim, Leonardo Brandelli chamou a atenção para a transmissão de imóveis virtuais. “No metaverso, esse tema tem tomado uma dimensão econômica grande e levado juristas a se debruçarem sobre ele. Têm-se entendido que isso é problema de direito contratual e não proprietário”, disse.

Segundo painel – O especialista Dietmar Malik ficou responsável pela apresentação do segundo painel, que tratou de jurisprudência selecionada sobre posse, usucapião e formas de aquisição de propriedade. A mesa foi presidida pelo ministro do STJ Paulo Sérgio Domingues, que fez as devidas apresentações, e por Bianca Castellar de Faria. Os debatedores foram Alexander Bruns, Gustavo Tepedino, João Costa Neto e Rogério Favreto.

Malik iniciou sua apresentação destacando os fundamentos entre o princípio de separação e de abstração. Ele abordou o princípio de separação com a distinção entre negócio vinculante e transmissão de um bem real, por meio do qual se produz uma alteração jurídica. Já no princípio de abstração, negócio jurídico e negócio de disposição têm efeitos independentes entre si e a invalidade da transação obrigacional não leva automaticamente à invalidade do negócio jurídico real.

O jurista alemão explicou os requisitos para usucapião de bens móveis e como se dá o procedimento editalício. “É utilizado para determinar a situação de direitos sobre propriedades ou para declarar a extinção de títulos ou direitos incertos. Envolve a publicação de um edital e determinação de prazo para que possíveis interessados se manifestem. Pode ser usado como forma de ‘limpar’ a situação dos direitos registrais de uma propriedade”, ressaltou.

Após sua apresentação, todos os debatedores destacaram os pontos que mais despertaram a atenção e realizaram comparativos com o Brasil. Alexander Bruns dividiu seus comentários em quatro tópicos, sendo um deles relacionado ao significado de posse na lei alemã. “A questão do direito imobiliário em relação à verdadeira questão de posse contribui de forma ampla para manter a ordem de paz dentro de um Estado de Direito livre. Nesse sentido, a proteção de direito à posse tem significado central na lei alemã”, concluiu.

8 e 11/03/2024 I 5º Seminário Brasil-Alemanha