Recuperação judicial: previsões e dificuldades

“Esse é um dos temas mais complexos que existem no Direito brasileiro”, assim o ministro Herman Benjamin, diretor-geral da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) abriu o webinário Temas Complexos da Recuperação Judicial, realizado na última semana. O ministro destacou a especialização da matéria e como ela traz matizes e olhares diferentes. […]

“Esse é um dos temas mais complexos que existem no Direito brasileiro”, assim o ministro Herman Benjamin, diretor-geral da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) abriu o webinário Temas Complexos da Recuperação Judicial, realizado na última semana. O ministro destacou a especialização da matéria e como ela traz matizes e olhares diferentes. “Um desses olhares é aquele que se vincula à pandemia que estamos vivendo”, completou.

O evento contou com a participação de ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), especializada em Direito Privado e com palestrantes que enfrentam o tema diariamente. Entre eles, os desembargadores Manoel Pereira Calças, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP); Moacyr Lobato, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), e Fernando Silva Wolff, do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), além das juízas Anglizey Solivan de Oliveira, do Tribunal de Justiça do Mato Grosso (TJMT), e Maria Cristina de Brito Lima, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ).

Tarefa difícil

Assim como em outros seminários, na abertura do evento estiveram presentes os presidentes da Associação de Magistrados Brasileiros, Renata Gil, e da Associação de Juízes Federais do Brasil, Eduardo André Brandão. A ministra Isabel Gallotti ficou encarregada de abrir as discussões. “Estamos vivendo um momento delicadíssimo da vida nacional e o tema de recuperação judicial não é um tema fácil, mesmo em circunstâncias normais envolve sempre dificuldades”, afirmou. Ela destacou o papel do juiz e a necessidade de observar a realidade das empresas antes da pandemia.

Gallotti ressaltou os instrumentos de medição e conciliação e indicou que “o juiz deve procurar estabelecer, dentro das suas limitações, uma forma para evitar a quebra em massa de empresas de setores mais prejudicados, o que pode levar a um problema em cadeia no nosso sistema, uma vez que as empresas são dependentes entre si”. Para a ministra, “será realmente uma tarefa muito difícil, mas que está à altura da nossa magistratura”.

Imprevisível

O presidente da primeira mesa de debates foi o ministro Antonio Carlos Ferreira, que destacou a situação do Poder Judiciário diante do número crescente de demandas e citou os muitos esforços, inclusive legislativos, para solucionar a questão.

“No ano passado, ainda antes da pandemia, o Conselho de Nacional de Justiça (CNJ) já projetava um cenário bastante sombrio para o ano de 2020, com a estimativa do ingresso de mais de 36 milhões de novas ações. Esse cenário projetado certamente foi agora agravado pelos efeitos da pandemia”, afirmou o ministro ao lembrar que os efeitos pós-pandemia ainda perdurarão por muitos anos.

Para Ferreira, um dos ramos diretamente atingidos pela crise econômica é o de recuperação e falência. “É difícil avaliar os efeitos gerais, os efeitos totais da pandemia, porque ainda estamos no centro do problema”, disse.

Soluções extrajudiciais

O ministro Luis Felipe Salomão, um dos maiores especialistas no tema, discorreu sobre o momento atual, os avanços tecnológicos, projetos de leis e precedentes. Segundo ele, o momento preocupante, no Brasil e no mundo, e especialmente na área econômica, vai desaguar no Judiciário. “É óbvio que vai ter um elevado incremento na atividade das varas empresariais, mas ainda é cedo para dizer se a alta já percebida nos pedidos de recuperação é decorrente do momento que estamos vivendo”, afirmou Salomão.

O ministro também citou o congestionamento dos processos e disse que o trabalho desempenhado já está no limite da capacidade. Ao exemplificar, citou que na Segunda Seção do STJ, cada ministro recebe dois processos por hora. “É um trabalho no limite da capacidade, então, se nós não trabalharmos para achatar essa curva, impedindo que essas demandas venham para o Judiciário e permitindo que elas possam ser solucionadas pelas formas extrajudiciais, que são eficientes e auxiliares à nossa tarefa, seria um verdadeiro suicídio”, concluiu.

Perpétuo

O segundo módulo foi presidido pelo ministro Villas Bôas Cueva. Segundo o ministro, o webinário trata de um tema muito importante “principalmente pelo momento em que passa o Brasil, com a crise sanitária e a crise econômica, que terá um desdobramento ainda pelos próximos anos, sobretudo nessa seara do direito recuperacional”.

Cueva citou a legislação e os debates atuais sobre sua melhoria e reforma. Apesar de reconhecer seus pontos positivos, como o fim da concordata como favor leal e a permissão de venda de unidades produtivas independentes, há muito a ser discutido, segundo ele.

O ministro afirmou que “o tema da recuperação judicial é perpétuo”. Ele citou os projetos de lei em tramitação que trazem algumas inovações além de consolidar temas que, para o ministro, “são importantes para que o direito recuperacional realmente faça frente às dificuldades que a gente enfrenta normalmente, enfrentou na última recessão e que agora, com a multiplicação de pedidos de recuperação, vai enfrentar com mais intensidade”.

Função social

O ministro Moura Ribeiro também esteve presente no segundo módulo do webinário, ele levou à discussão vários precedentes do STJ, alguns com entendimentos divergentes, como a questão do produtor rural, alienação fiduciária, contagem de prazo, honorários na recuperação judicial e outros. Ainda citou alguns pontos do Projeto de Lei 1397/20, de autoria do deputado Hugo Leal, em tramitação. “Quando falamos de recuperação judicial, estamos falando na possibilidade de o devedor não ser entendido como um descumpridor de contratos, de obrigações. Em suma nós estamos falando do contrato como função social”, afirmou Moura Ribeiro. “Essa ideia de preservação da empresa é muito maior para todos nós em razão daquilo que é o objetivo maior de manter a empresa e manter o emprego”