Vozes da Justiça: juíza Karen Luise destaca importância das mulheres na Justiça

Série de entrevistas idealizada pela Enfam tem como objetivo visibilizar pautas importantes para a magistratura brasileira

A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) lança nesta quinta-feira, 9, a série de entrevistas “Vozes da Justiça”. A ação mensal tem como objetivo visibilizar pautas importantes para a magistratura brasileira, a partir das percepções e contribuições dos juízes e juízas que colaboram com a Escola. Em alusão aos marcos do Dia Internacional da Mulher e do Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial, ambos celebrados no mês de março, a convidada da primeira edição é a juíza de direito Karen Luise Vilanova Batista de Souza, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS).

A juíza Karen Luise, que ministra a disciplina Proteção do Vulnerável, Acesso à Justiça e Direito Antidiscriminatório, no módulo nacional de formação inicial da Enfam, é natural de Porto Alegre e atualmente reconhecida como magistrada defensora dos direitos humanos e da luta antirracista.

A juíza ressalta que é preciso reconhecer que a nossa sociedade é plural e diversa. E que, da mesma forma, todos os espaços precisam ser ocupados. “Não podemos ter uma magistratura que represente apenas um grupo social, um grupo racial.” Para ela, a área precisa refletir as visões de várias pessoas que partem de diferentes lugares e tenham tido experiências distintas em suas vidas. “Inclusive, pelas lentes do gênero e da raça”, aponta. E conclui: “É preciso mais ações afirmativas para que mulheres negras e indígenas possam ocupar a magistratura”.

Ações Afirmativas

Karen Luise destaca a importância de as mulheres terem igualdade em oportunidades de estudo. “Para que tenham acessos à dedicação exclusiva, educação de qualidade, a cursos preparatórios, muitas vezes não viabilizados para elas”, e reflete sobre a necessidade de os concursos públicos terem mecanismos que considerem as realidades e diferenças entre as pessoas. “Foi o que ocorreu com as vagas reservadas pela política de cotas. A gente tinha uma cláusula de barreira, que limitava o número de pessoas que passavam para a segunda fase do concurso, eliminando muitas pessoas negras”.

Ainda sobre as cotas, a juíza explicou que não há mais cláusula de barreira, mas tem a percepção de que, nos concursos onde não mais existe essa disposição, a segunda fase tornou-se ainda mais difícil, o que pode representar um ato de discriminação indireta, em razão de uma ação aparentemente neutra, mas discriminando certo grupo. O que, para ela, “demonstra a utilização de critérios que vão acabando por limitar e afunilar o acesso de determinados grupos raciais, os quais experimentam ao longo da sua trajetória situações que não os privilegiam para desenvolver estudos”.

Progresso na carreira

A juíza destacou outros desafios para o progresso de carreira de mulheres na magistratura e para que possam ascender aos tribunais superiores. “Na forma de progressão, na forma de pontuação, o exercício da própria maternidade não é considerado como algo positivo. Isso faz com que, por exemplo, no critério de merecimento, muitas vezes as mulheres não consigam ascender.”

A juíza finaliza a entrevista convocando as mulheres a não desistirem e reforça que é preciso haver uma política pública dentro do Poder Judiciário que incentive mais o ingresso de mulheres na carreira. “Embora esse lugar ainda seja um lugar muito solitário, o exercício da jurisdição enquanto mulher negra é um espaço que é possível. É um espaço que pode ser ocupado por todas. É um espaço que, por meio do Encontro Nacional de Juízas e Juízes Negros, se tornou mais confortável. A partir do momento que nós nos enxergamos uns nos outros e vimos que nos consolidamos como um coletivo que atua em rede de apoio em diferentes dimensões, foi possível avançar em políticas judiciárias que privilegiem e que promovam a equidade racial”, afirma.  

Vozes da Justiça – Iniciativa idealizada pela coordenação de Comunicação da Enfam, em parceria com o projeto Formação Judicial Qualitativa, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).