Webinário debateu o processo coletivo brasileiro sob a ótica da magistratura

O webinário “O processo coletivo brasileiro em transformação: uma análise sob a ótica da magistratura”, ocorrido na última quinta-feira (7/10), apresentou os trabalhos que vêm sendo desenvolvidos pelo Grupo de Estudo, Pesquisa e Inovação (GEPDI 8) destinado a estudar processos coletivos e estruturais, sob a coordenação do professor e juiz de Direito no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) Fernando da Fonseca Gajardoni.

O webinário “O processo coletivo brasileiro em transformação: uma análise sob a ótica da magistratura”, ocorrido na última quinta-feira (7/10), apresentou os trabalhos que vêm sendo desenvolvidos pelo Grupo de Estudo, Pesquisa e Inovação (GEPDI 8) destinado a estudar processos coletivos e estruturais, sob a coordenação do professor e juiz de Direito no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) Fernando da Fonseca Gajardoni.

A abertura do evento coube à coordenadora acadêmica do Mestrado da Enfam e desembargadora federal do Tribunal Regional Federal (TRF4), Tais Schilling Ferraz. “A Enfam, por muitos anos, ficou dedicada a aperfeiçoar os nossos modelos de formação no âmbito das escolas judiciais e da Escola Nacional, mas hoje as atividades também estão direcionadas a fomentar a pesquisa. Esse evento vem justamente na linha de demonstrar o que vem sendo feito na Escola Nacional em termos de pesquisa”, afirmou a magistrada.

Em consonância com as palavras da desembargadora, o juiz Fernando Fonseca Gajardoni explicou que o GEPDI 8 foi formado para desenvolver pesquisas ligando o tema dos processos coletivos estruturais com o papel do Poder Judiciário. “Destaco que o processo coletivo brasileiro e o estrutural estão em constante transformação. Há quase 30 anos, tentamos desenvolver uma política adequada de processos coletivos e, nessas tentativas, diversos projetos legislativos foram apresentados, alguns deles se tornaram lei e outros estão em andamento”, disse o coordenador do Grupo.

Cláusulas gerais

O juiz federal do TRF1 Deomar da Assenção Arouche Júnior apresentou os resultados parciais da temática “Cláusulas gerais executivas como instrumento de efetivação das decisões estruturantes”. O magistrado explicou os dispositivos legais sobre o assunto contidos no Código de Processo Penal, a aplicação aos processos estruturantes e os parâmetros que devem ser observados.

“Há uma preocupação dentro da doutrina, uma jurisprudência ainda muito reduzida a respeito do assunto no que diz respeito aos limites na escolha das medidas. Há parâmetros que podem ser observados como forma de controle”, afirmou o magistrado.

Improbidade administrativa

O segundo tema, “Acordo de não persecução cível nas Ações de Improbidade Administrativa: o PLS 2.505/2021”, foi tratado pelo assessor do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Fabiano da Rosa Tesolin. A ideia inicial era falar sobre a proposta contida no Projeto de Lei que tramitava no Senado Federal e que trata sobre a reforma da Lei de Improbidade Administrativa. Recentemente, o PL foi aprovado pelo Congresso Nacional e remetido à sanção do presidente da República.

Diante disso, o assessor do STJ focou sua exposição no texto final da proposta. “Quem pode realizar esse acordo é, exclusivamente, o Ministério Público Federal, tanto para ajuizamentos quanto para realização de acordos. Talvez essa seja uma das grandes mudanças da Lei. Os dispositivos também preveem que podem ser realizados acordos, conforme o caso, desde que haja a possibilidade de dois resultados, o integral ressarcimento do dano ou a reversão da pessoa jurídica desse valor desviado”, explicou o discente.

Tutela do transporte público

Em continuidade aos trabalhos, o professor e advogado especialista em direitos do consumidor e em relações de consumo pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Fabrício Germano Alves apresentou o resultado parcial de sua pesquisa sobre “Tutela coletiva do consumidor no serviço público de transporte”. Sua exposição levantou um questionamento: será que existe um direito do consumidor à prestação de transporte de serviço público de maneira adequada e continua?

A partir dessa indagação, outras perguntas se fizeram pertinentes e, segundo o discente, necessitam de aprofundamento detalhado sobre quais as cobranças podem ser impostas às empresas responsáveis pela prestação do serviço público. “Já existem estudos específicos sobre serviços públicos essenciais, mas precisamos de mais pesquisas para verificar se, na prática, é possível resolver o conflito a partir de um processo estrutural”, disse o especialista.

Infância e juventude

A palestra sobre o quarto tema, “Processo estrutural na tutela da infância e juventude”, coube à juíza de Direito do TJ do Acre Isabelle Sacramento Torturela. Ela iniciou sua exposição remontando às origens do processo estrutural, que ocorreu nos Estados Unidos, em 1954, quando os alunos eram direcionados às escolas de acordo com sua raça.
Segundo ela, é razoável pensar no processo estrutural através da infância, uma vez que o sistema de proteção e garantias dos direitos das crianças e adolescentes é complexo e abrange outros sistemas para além da educação, tais como saúde, assistência social e aplicação das medidas socioeducativas. “O processo estrutural é feito por vários polos de atuação, não será um órgão específico ou apenas um gestor que conseguirá implementar as devidas políticas públicas. As mudanças são complexas, demandam várias atuações, e devem ser prospectivas, olhar o hoje pensando no futuro”, afirmou a magistrada.

Dever de imparcialidade

O tema seguinte, “Atuação estratégica do juiz no processo estrutural e dever de imparcialidade”, foi apresentado pela juíza federal do TRF1 Lais Durval. Em sua argumentação, ela utilizou um julgado da ministra Nancy Andrighi, de 2020, em que há a afirmativa de que a resolução dos litígios estruturais deve ser construída em ambiente colaborativo e democrático.

“Infelizmente, ainda há essa concepção tradicional de que a decisão justa pode ser construída sem a cooperação das partes. A missão do juiz no processo coletivo estrutural é abandonar a visão tradicional. O magistrado é responsável por gerir o processo, estimulando o contraditório e a cooperação das partes”, pontuou a magistrada em sua exposição.

Cooperação judiciária

O tema “Cooperação judiciária em processo estrutural” foi exposto pelo juiz federal do TRF5 Leonardo Resende Martins, que destacou que o Código de Processo Civil é enfático em estabelecer o dever de recíproca cooperação entre os juízes, na tentativa de romper com a cultura individualista e de autossuficiência, em transição para a lógica de atuação em rede, que atende de maneira mais adequada às complexidades dos conflitos.

“Eu destacaria que a complexidade dos litígios estruturais é um fator que exige a atuação em cooperação com muito mais incidência. A complexidade deriva da quantidade de pessoas impactadas, dos diversos entes públicos e privados envolvidos na solução do caso, no nível de conflituosidade interna, na extensão territorial abrangida pelo litígio, enfim, ainda os impactos sociais, econômicos e políticos”, argumentou o juiz federal.

Saúde

Seguindo com os trabalhos, o juiz federal do TRF4, Oscar Valente Cardoso, centrou sua exposição no assunto “Processo estrutural em tema de saúde”, que faz parte do dia a dia dos magistrados, seja na Justiça Estadual ou Federal nos últimos anos, em processos relativos ao fornecimento de medicamentos e, de forma geral, a tratamentos na saúde pública.

Os primeiros processos sobre o assunto surgiram nos anos 1990. Já em 2010, a União passou a fazer um acompanhamento mais detalhado dos gastos da chamada política judiciária da saúde. “Continuamos fazendo um debate simplificado para o tratamento dessas questões complexas. Tudo acaba ficando prejudicado porque se resolve às pressas de forma individual, e o Poder Público acabou se acostumando a cumprir as decisões judiciais, seja no fornecimento de medicamentos ou permitindo o sequestro de valores”, explicou o juiz federal.

Intervenção judicial em empresa

O juiz federal do TRF4 Tiago do Carmo Martins abordou o tema “Intervenção judicial em empresa por ato de improbidade”, em busca de respostas sobre o que o Judiciário pode fazer diante de uma situação permanente e reiterada de irregularidade em que uma entidade empresarial recalcitra em práticas de atos de improbidade administrativa (Lei n. 8.429/1992) ou atos lesivos previstos na Lei Anticorrupção (Lei n. 12.846/2013).

“Temos a compreensão de que as leis de improbidade administrativa e a de anticorrupção se inserem em um contexto maior, chamado de microssistema anticorrupção. É viável decretar a intervenção judicial em empresa contumaz na prática de improbidade ou lesivos sempre que isto se faça necessário e indispensável para a cessação de danos ao erário e para o pronto reestabelecimento da ordem violada”, disse o magistrado.

Ações possessórias coletivas

A juíza de Direito do TJ do Mato Grosso Adriana Sant’Anna Coningham destacou, em sua apresentação sobre “Representatividade passiva nas ações possessórias coletivas”, que representatividade adequada é requisito essencial para o regular desenvolvimento de qualquer ação coletiva, haja vista que define sobre quem recairão os efeitos das decisões prolatadas.

“As ações possessórias exigem uma postura mais proativa do julgador, que deve atuar para equilibrar as forças litigantes, garantindo que se observem o processo legal e direitos fundamentais subjacentes ao conflito”, afirmou a juíza ao deixar a questão para reflexão dos demais discentes e docentes.

Confira a apresentação completa de cada uma das palestras no canal da Enfam no YouTube.